UZUMAKI de Junji Ito e a "normalização do absurdo"

Fábio Melo*


Junji Ito é o "mestre do mangá de terror". Ele tem a sinistra capacidade (ou qualidade) de transformar coisas "aleatórias" em forças sinistras e hediondas. No caso de Uzumaki a coisa são "espirais"  - uzumaki em japonês. 

A história de Uzumaki acompanha a jovem Kirie e seu namorado Shuichi, que vivem situações bizarras envolvendo espirais na cidade de Kurôzu. A trama se desenvolve num crescente de situações estranhas, envolvendo muito body horror; além do passado, presente e futuro da cidade de Kurôzu. 

O ponto que chama a atenção é a forma como que as espirais horrendas vão, gradativamente, se tornando algo "normal" no cotidiano da população daquela cidade. As formas horríveis, as distorções corporais e a própria cidade que vira uma espiral bizarra são elementos que deixam de ser absurdos e se tornam o "novo normal" naquela realidade caótica. Os protagonistas, que de início percebem o crescente horror das espirais, são os "estranhos" justamente por serem os "normais", ao achar toda aquela situação absurda, bizarra e diabólica. 

A pergunta que fica é: numa realidade absurda, caótica, bizarra, o que mais se aproxima de um "normal" é o "estranho"? (podemos até se questionar, afinal, o que é "normal").

Os comentários de Masaru Sato ao final do mangá são intrigantes. Mostram como a partir daquele universo bizarro e absurdo é possível explicar o capitalismo.

Ótima leitura para quem curte mangá de terror e o estilo inconfundível de Junji Ito.


Título: Uzumaki
Autor: Junji Ito
Editora: Devir
Ano: 2020




Fábio Melo é Historiador. Membro fundador e permanente do Grupo de Estudos Americanista Cipriano Barata (GEACB: http://geaciprianobarata.blogspot.com/)

Comentários